domingo, 23 março, 2025

Lea

Lea

Lea me apresenta o bolo de laranja .

Pensei que fosse de aipim , e me decepciono .

Mas do jeito que ela segura o vidro ( com tanta força ) imagino a firmeza do seu povo .

Quando olho para ela vejo ancestralidade , e uma senhora que lhe acompanha .

Pergunto de onde vem essa raiz … , e ela responde :

  • Moro com minha avó Dona Lourdes , de 82 anos…

Lea desconfia de minhas perguntas , está cansada e trabalha com afinco .

Mulher de múltiplas habilidades e resistência .

Seu sorriso é sério , sua tez brilha …

  • Você sabe costurar cozinhar e fazer outras coisas ?

Ela me diz incisiva :

-Pense numa pessoa que não sabe fazer nada ..!?

Não acredito em sua resposta .

Para chegar até aqui deu muito trabalho …

Lea mói o pó de café e liga a máquina !

Ela é magra . Um feixe de músculos . Enérgica e silenciosa…

Não posso deixar de notá-la , sua cor reluz na Aurora…

Sim… Eu posso ver …

Que mesmo não sendo ela , ou sendo outra , o labor faz parte de sua vida , ainda hoje …

É como um fardo que se perpetua !

Parcos e exíguos rendimentos que se multiplicam , pagam contas , criam filhos , pequenos milagres cotidianos .

Agora ouço uma gargalhada ao fundo.

É grave e não parece dela .

Então digo :

  • Sua avó sorri com sua boca !

Então ela olha me inquirindo , e não desvia a fronte !

Peço desculpas …

Tento explicar :

  • As vezes não me contenho ! Sou escritor …

Quando espero uma reprimenda , ela responde :

  • Que bom !

Agora Lea entende e aceita , e relaxa …

Pergunto em pensamento :

Quanto tempo foi necessário para que isso acontecesse ?

Para que o povo enfim descansasse dos rigores ?

Não há resposta audível…

Mas eu li nos livros que foram 380 anos…

Mesmo ainda assim hoje não descansam .

Parece que sempre há algo a ser feito , uma pedra que se carrega , uma tarefa inconclusa…

O uso do cachimbo deixa a boca torta !

A força do hábito cria imagens indestrutíveis .

E muralhas !

Que protegem e separam !

Agora os muros intransponíveis se afastam …

Tijolo por tijolo !

Eu e Lea vamos caminhando …

Em direção ao Firmamento .

Lá eu conto histórias…

E ela repousa…à sombra de um olmo…

Como se nada acontecesse…

Mas ela não perde a pose , limpa com um pano a mesa .

E volta para o balcão …

Flavio Fucs
Flavio Fucs
"Poeta sou cumpro meu Fado . Como o dum santo ou dum louco . Só posso dar demais ou muito pouco . Que é tudo quando tenho ." José Régio
- anúncio patrocinado -

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Seu comentário:
Nome

- anúncio patrocinado -
- anúncio - spot_img
spot_img

Mais da Coluna

O GRÃO MILHO

Quem não conhece Suéliton ?Vice-Diretor da Escola Municipal de Caeté Açuprofessor de matemáticaele passa todo dia com sua motocom uma grande caixarecheada de Pamonhas...São...

Lourinho

Era como minha mãe chamava meu pai em vida… Carinhoso apelido que guardei na memória dos dias…E esse homem que vos apresento , por coincidência , tem o mesmo nome…

UILTON

O cara atravessou … Disseram que não iria atravessar . Mas ele conseguiu ! Montado no lombo do seu burro riscou os gerais intransponíveis . Caboclo bom ! De fibra ! Filho de seu Almir e Dona Dinha !

Veja Também

- anúncio -
- anúncio -
Morro Branco_banner
Um lugar para estar...
Morro Branco_banner
Um lugar para amar...
Morro Branco_banner
Um lugar para acreditar...

- em destaque -