Foi-se há pouco do nosso vale abençoado esta pessoa como poucas. Seu Joãozinho era um arquivo, uma biblioteca de histórias de vida, com seus ensinamentos preciosos.
Homem muito trabalhador, enquanto teve condições soube o caminho do garimpo, pegava o saco* com o sócio, rumava para as lavras e lá ficava entre as brumas, a chuva, o sol, a bateia, peneira, picaretas, pás, marrão… Riscos enormes e não foram poucos aqueles que esqueceram a vida lá na serra e por lá ficaram escondidos nas frestas, nos túneis desabados, muitos!
Mas S. Joãozinho seguiu e ficou entre nós para nos ensinar. Era uma delícia sentar em sua porta, no passeio, escutando dele em todos os detalhes, como e quando aqui chegou, como aprendeu a cata do diamante, e as coisas que se faziam antes, as dificuldades e como supera-las. Construiu-se de lendas.

Explicava demoradamente da chuva d’outros tempos ou da seca de 30, contou da mulher, fugida do sertão crestado pelo sol, que pediu farinha lá no Pati pra algo fazer por suas crias e o homem ao qual ela implorava deu-lhe um saco cheio… de areia! Queria se divertir da desgraça de outrem. Mas qual não foi o seu pasmo, quando viu sua própria farinha tornar-se areia, enquanto a mulher feliz, algo deu pra encher a barriga dos pequenos. Repito: Seu Joãozinho era feito de lendas.
Lendas não são criações fantasiosas, lendas são descrições da realidade, descrições estas embebidas do mito, da lição moral a ser dada, da mensagem que educa. Aquele homem de princípios tinha claridade quanto ao que deveria ser ensinado àqueles que não tiveram a sorte e a dor de experimentar o que ele passara.
É maravilhoso ver uma pessoa chegar a provecta idade, como foi o caso dele, com a dignidade de quem conseguiu!
Recebam todos o meu carinho!
* O garimpeiro não tinha recursos, carecia de um sócio que investia, mas não “pegava no pesado”. Uma das coisas que o sócio providenciava era um saco com rapadura, feijão, farinha etc. para que se mantivesse pelos próximos dias na serra em sua busca.